Leda Cartum, Marcos Cartum
Relicário, 2018
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conto ganhador do prêmio Off-Flip 2014
Talvez vocês tenham percebido que os leitores de Bruno Schulz formam uma espécie de sociedade secreta, em que cada membro tem também a sua seita e seus ritos particulares. Mas eu sei, por experiência própria, que cada leitor tem seu Bruno Schulz particular; doido, ingênuo, ardiloso, um gênio — eu já conheci de todo tipo. Quando dois leitores de Bruno Schulz se reconhecem, alguém acena de dentro de seus olhos, talvez um menino “que aguarda para ouvir seu nome em uma história de ninar”. A citação, que eu tirei completamente de contexto, é de David Grossman, que tentou dar ao seu Bruno Schulz os gestos e palavras de um bonequinho de ficção. Heresia — alguns vão dizer. Outros vão dizer que isso é tão Bruno Schulz.
Mas este livro é sobre outras coisas. É sobre um cavalo. E sobre a sensação de conduzir um cavalo — que é, em algum momento, se deixar conduzir por ele. Para os desequitados, é algo como a sensação de criar tubérculos na geladeira. Leda escreveu um texto sobre palavras que brotam umas das outras; e agora, neste livro, resolveram brotar desenhos. Essas palavras e esses desenhos brotaram das palavras e desenhos de Bruno Schulz. Este não é um livro sobre bonecos de ficção nem sobre as cordas e engrenagens que fazem um boneco andar sozinho. É sobre o sopro que faz o boneco querer andar. Isso, eu vou dizer, é tão Bruno Schulz.
Bruno Schulz viveu na primeira metade do século passado, em uma cidade muito pequena que já pertenceu a muitos países. Morreu com cinquenta anos, mas na memória sempre parece que ele era muito mais jovem. Escreveu dois livros, publicou um álbum de desenhos e deixou muitos esboços. Seu emprego era dar aulas de desenho em uma escola de ensino primário. Dizem que aos alunos que não aprendiam direito ele contava histórias. Marcos conta boas histórias. Leda diz que não aprende direito. Todos nós gostamos de cavalos. A graça do cavalo está em segui-lo com o olhar, e depois, quando ele estiver onde a vista não alcança, continuar seguindo. Este livro é sobre isso também.
Danilo Hora
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